quarta-feira, 18 de novembro de 2015

20 de novembro – Dia de luta contra o racismo capitalista

Suzete Chaffin
Professora - presidenta do PSOL Jacareí/SP – Unidos pra Lutar/Luta Socialista

         Há uma canção popular que afirma: “negro é a raiz da liberdade”. Não é uma canção de protesto, mas cumpre o objetivo de homenagear os originários da África, que deram ao povo brasileiro muito mais do que a contribuição evidente na cor da pele da maioria do nosso povo, 53,1%, segundo o IBGE). E, convenhamos, em 1981, quando esse samba foi gravado singularmente por Dona Ivone Lara, não se ouviam tantos desses discursos que dão cor aos palanques eleitorais, por meio da dita “democracia racial”.
O mito da democracia racial foi criado pela elite dominante para abafar o fato de que o racismo no Brasil é estrutural e institucionalizado. Por isso, a luta de negros e negras é constante e tem obtido importantes conquistas, e não concessões: a Lei que cria o Dia da Consciência Negra no dia 20 de novembro, as cotas raciais nas universidades públicas e a Lei que torna obrigatório o ensino de história e cultura africana e afro-brasileira nos estabelecimentos de Ensino Fundamental e Médio (* ver resenha das leis no rodapé).
E, embora os livros didáticos ainda apresentem pouquíssimas figuras negras, aos poucos vai-se fazendo justiça a heróis como Zumbi dos Palmares, principal liderança do Quilombo dos Palmares, que se localizava na Serra da Barriga, atual Estado de Alagoas; Dandara dos Palmares, Teresa de Benguela e Luísa Mahin,   líderes quilombolas, Luiz Gama, a quem a OAB agora faz justiça outorgando-lhe o título de advogado, 133 anos após a sua morte, e João Cândido, o almirante negro, líder dos marinheiros que lutaram na Revolta da Chibata, na Bahia de Guanabara, e conquistaram em novembro de 1910, melhores condições de trabalho na Marinha do Brasil, e principalmente, o fim dos castigos físicos que lhes eram aplicados com o uso da chibata. 
         A reflexão sobre a situação do negro está espelhada num conjunto de dados estatísticos que implicam num quadro real de desigualdade e opressão. Dados oficiais (IBGE/PNAD/2014) concluem que os negros (as) são os que têm menor escolaridade; representam 15% dos estudantes universitários; as taxas de analfabetismo são duas vezes superiores ao restante da população; correspondem a 67% da população carcerária; têm menor acesso à saúde; são os que morrem mais cedo e têm a menor participação no Produto Interno Bruto (PIB). Os negros (as) ganham o equivalente a 57% do salário dos brancos e são a maioria dos 60,6% de desempregados. O sistema tributário é injusto não só pela perspectiva de classe (trabalhadores pagam mais impostos que as grandes empresas), mas também pelo recorte de gênero e raça. As mulheres negras estão na base da pirâmide social e pagam, proporcionalmente, mais impostos do que homens brancos e têm menos acesso aos direitos e políticas públicas.
A violência policial contra os negros é prova de que a polícia traça seu perfil de suspeitos tomando por base a cor da pele. É negra a maioria dos assassinados, torturados e vítimas de humilhação do aparato policial. Jovens e pobres correm mais risco, a chance de um adolescente negro ser assassinado é 3,7 vezes maior que a de um branco. Não à toa, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, omitiu nas estatísticas sobre a violência (22/10/15) os dados de mortos por PMs de folga e de mortes causadas por policiais civis, no terceiro trimestre deste ano. Foi em horário de folga que agiram os PMs “suspeitos” de comandar a chacina de Osasco.
Até o Censo de 2010 as estatísticas oficiais davam conta de que a maioria da população brasileira era branca. A boa notícia é que desde 1991 tem-se observado o aumento do número dos que se declaravam brancos e agora se dizem pardos; bem como dos que se diziam pardos e passaram a se reconhecer pretos. Isso levando em conta que a pergunta do Censo do IBGE sobre ”cor e raça” dá somente as opções de: branca, preta, parda, amarela, indígena. Logo conclui que somados pretos e pardos formam a população negra do país, que em 2004, era de 48,1% e em 2013 chegou a 53,1% (IBGE/PNAD/2014).
Essa mudança política e cultural se caracteriza pelo aumento da autoestima da população negra, que se confirma pela alteração de postura diante de situações de racismo. É cada vez maior o número dos que denunciam. São famosos e anônimos como: a cobradora, em Brasília, após pane no ônibus; a estudante que postou fotos com o namorado branco; a jornalista Maju Coutinho, moça do tempo do Jornal Nacional; a atriz Thaís Araújo; e vários jogadores de futebol, entre os quais está o goleiro Aranha, do Santos, que por sua atitude firme virou símbolo da luta antirracismo. Enfrentou as críticas do próprio Pelé, para quem o goleiro “se precipitou” ao reagir. Porém, denunciar é essencial para romper a expectativa da burguesia de ter negros (as) sempre “domesticados” e “embranquecidos”, que para serem aceitos pela sociedade neguem sua origem e se esforcem para parecerem brancos.
Felizmente há um avanço de consciência, que não se deve somente às atitudes individuais de coragem, mas também às mobilizações populares. Expressam resistência os que descem da favela e protestam no asfalto, como na busca pelo Amarildo, pedreiro desaparecido da Favela da Rocinha (RJ), assassinado pela polícia; e os jovens da periferia de Osasco (SP), a maioria negros, quando saíram às ruas contra a chacina praticada por policias, que deixou 19 mortos.
O capitalismo fez dos negros (as) suas vítimas preferenciais, pois a “libertação” promovida pela elite branca os deixou sem eira nem beira, sem casa para morar, sem chão para plantar, sem direito a estudar. A manutenção do racismo interessa aos empresários, banqueiros e latifundiários para que possam contar sempre com mão de obra mais barata.
Não se pode perder de vista que há persistência no combate à herança histórica de escravidão, segregação racial e racismo. A criação de uma data destinada à valorização da raça negra tem contribuído para que a população negra possa conhecer e julgar sua realidade, sob a perspectiva de ser reconhecido por seus valores, sua luta, por sua história. A pseudolibertação se deu, mas é necessária nova abolição para tornar livres mulheres e homens: negros, brancos, índios, que em pleno século XXI seguem lutando contra o sistema capitalista.
A raiz da história de luta do povo brasileiro por liberdade tem origem negra. Mas, as verdadeiras e duradouras conquistas dos negros estão intimamente ligadas às lutas e às conquistas da classe trabalhadora, pois a verdadeira abolição só será alcançada com a vitória de uma sociedade socialista.


Nota * O Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra, celebrado em 20 de novembro, instituído Lei nº 12.519/ 2011;  A Lei nº 12.711/2012, sanciona pelo Decreto nº 7.824/2012, que define as condições gerais de reservas de vagas para as instituições federais de educação superior e ainda a Portaria Normativa nº 18/2012 que prevê as modalidades das reservas de vagas e as fórmulas para cálculo, fixa as condições para concorrer às vagas reservadas e estabelece a sistemática de preenchimento das vagas reservadas;  Lei 10.639/2003 que altera a  Lei no 9.394/1996 que inclui o estudo da História da África e dos Africanos, a luta dos negros no Brasil, a cultura negra brasileira e o negro na formação da sociedade nacional, resgatando a contribuição do povo negro nas áreas social, econômica e política pertinentes à História do Brasil.

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